sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

O Encanto de Rita Ribeiro

Rita Benneditto está de férias em São Luís. A cantora veio rever familiares, amigos, se reabastecer de afeto, cultura e da culinária maranhense, mas também veio articular o lançamento na cidade, do seu mais recente disco, Encanto (distribuído pela gravadora Biscoito Fino). O lançamento oficial será em março no Rio de Janeiro.

Encanto é o primeiro após 8 anos do lançamento de Tecnomacumba (2006) e marca os 25 anos de carreira dela, com inéditas e releituras. Todo o disco remete à cultura maranhense, seja em arranjos ou outros elementos. Um disco que ficou como ela queria e que traz três músicas em parceria e releituras de Gilberto Gil (Extra), Roberto Carlos (), Djavan (Água), Jorge Benjor (Santa Clara Clareou) e Villa-Lobos (Estrela é lua nova), com participações de Frejat, Arlindo Cruz e Reggae B e produção de Felipe Pinaud.

Está previsto também para este início de janeiro o lançamento de Som e fúria, disco que gravou com a cantora Jussara Silveira, em uma produção de Alê Siqueira e direção artística de José Miguel Wisnik e que traz como principal elemento a voz. A obra foi toda gravada em uma caverna na Chapada Diamantina.

Rita fica encantada ao falar do novo disco. E para defini-lo ela recorre a elementos e situações do local em que gravou Lençóis, e da cidade de sua inspiração, São Luís. Entre metáforas e num linguajar que esbanja lirismo, Rita diz que o CD é a marca de um renascimento, de um rebatismo e de fé, em todos sentidos. Tanto no sentido de esperança, quanto de mudar para melhor., não por acaso, é a faixa título do disco.

O disco, porém, ela trata de dizer, não é religioso, mas a música é a sua religião. Encanto é o sexto álbum solo e expõe a devoção de Rita à deusa música, pondo fé num som afro-brasileiro de alcance universal. “O CD tá bem diversificado com tecno, macumba, dance, reggae, pop, samba, rock. E é permeado pela seta que aponta e no meio da história se espalha para todos os lugares. É a caboca Jurema com força total”, diz ela referindo-se a duas vinhetas que tem no CD.

“Uma das vantagens ao longo da carreira é que sempre realizei projetos do jeito que imaginei. Eu vejo o disco como um grande quadro por conta das nuances, dos traços, do caminho que foi traçado até chegar ao resultado final. Uma dessas imagens são as raízes de mangue são bem estruturadas embora estejam em solo de maré, e essa estrutura se espalha. Assim é o meu trabalho musical. Faço música para ela se espalhar pelo mundo. Músicas que chegam a qualquer lugar. Esse trabalho tem muita verdade e está recheado de referências maranhenses”, compara Rita.

Outra comparação feita por ela é quanto aos movimentos das areias observadas nos Lençóis Maranhenses, local onde foram feitas as fotos para o CD. “Observar esse movimento foi uma das viagens que fiz e eu quis ir para um lugar encantado que tenha movimento, mudança, como o que aconteceu comigo a começar pelo meu nome”, reforça.


Faixa a faixa por Rita Ribeiro
1. Centro da Mata - É um tema de domínio público adaptado por Rita com Felipe Pinaud. É uma vinheta que fala da caboca Jurema, que a acompanha desde o primeiro disco. “Achei importante abrir o disco com uma vinheta. É uma caboca do mundo que transcende o espaço. É como se ela se preparasse para atirar a seta para todos os lugares, e tempos e conexões, com uma levada sutil do Boi de Pindaré.
2.Guerreiro do Mar – Música de meus parceiros e que representa o encontro entre energias masculina e feminina. Energia de ogum com Iemanjá. Essa música tem uma pegada rock com arranjos do rock progressivo, meio Pink Flouyd, uma levada de reggae. Quis trazer esse ponto. Foram viagens musicais sonoras.
3. Santa Clara Clareou – Faço uma referência ao Tecnomacumba. É quase uma oração, com arranjos baseado no ritmo do tambor de mina, homenageando essa manifestação, tão importante para a minha formação artística.
4.Pedra do Tempo – Falo da figura de Xangô, de toda a simbologia dele. Te, uma vinheta de Villa Lobos. Como eu já cantei essa música em corais, eu quis trazer essa memória afetiva.
5.Água – Queria muito fazer uma música que retratasse o elemento água pela importância que ela tem para a humanidade e para chamar a atenção sobre ela. É uma música de Djavan. Fiz também um arranjo trazendo a cultura maranhense no toque das caixeiras do Divino.
6.Banho de Manjericão – Inspirada no ritmo do terecô maranhense. Convidei o babalorixá Oboromin T’ogunjá, que incorporou o Pai Benedito das Almas de Angola e deixou uma mensagem de amor e de fé. Da fé que está dentro da gente. Um convite à transformação, à mudança... e eu faço isso nos meus trabalhos, que é ter uma visão mais ampla, mais transcendental.
7. Babalu - É um clássico da música. Quis trazer essa música mais anos 70 e é a primeira vez que canto uma música em espanhol, mas acho que está muito honesto. Babalu é um dos nomes do orixá Obaluaê.
8.Estrela é Lua Nova – É a mais antiga do disco. De Villa-Lobos em que ele . expõe a sua erudição. Ele brinca com a palavra macumba.
9.Fé – Sintetiza o Encanto. Sou cantora de fé, mas não de dogmas. Não sou presa a nenhuma religião. Estou ligada na música como religião, como elemento transformador. E essa música tem uma força, por ser de Robert Carlos e por termos feito um arranjo rock’n’roll, que é atemporal e todo mundo curte.
10.Extra – Tem a participação da banda Reggae B, (integrantes do Paralamas do Sucesso), comandada pelo Bi Ribeiro e aí eu quis resgatar para fazer a base da música. É um reggae bem 4x4, mais roots, quis fazer essa ligação com o reggae do Maranhão. A música fala também de transcendência, de Deus. Convidei o padre jamaicano rastafári Priest Tiger, que encarna o mensageiro da fé e quando traduzimos a mensagem dele vimos que se tratava do Salmo 24 (oração do Evangelho). Tudo a ver com a música, que fala do Deus que está dentro de nós.
11.Filha de Tupinambá – Outra vinheta de Jurema, porque como eu te falei, a seta está lá no início e prepara o CD. Toca nova vinheta, reafirma a origem de Jurema.
12.De Mina – É uma composição de Josias que eu adoro e que fala do tambor de mina, que me recoloca na minha aldeia. Fui gravar a voz no estúdio do Frejat e pensei que podíamos convidá-lo. O Frejat toca guitarra tem a pegada rock, que é a característica dele e ele topou e adorou participar, pirou nos arranjos. (N.R: essa música também tem a seta de Jurema chegando a seu destino final).
13. O que é dela é meu – É um samba do maravilhoso Arlindo Cruz em que a gente celebra a vida. A gente se encontrou em um trabalho e ele me disse que tinha uma música pra mim. Pedi pra ele mostrar e adorei. Disse que queria gravar no meu disco, daí convidei ele pra gravar e ele adorou. Não só cantou, como tocou banjo, bateu palma. Ele gosta muito do Tecnomacumba e fez essa brincadeira evidenciando a cultura africana.

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