O historiador e defensor público federal
Yuri Costa lança na próxima sexta-feira (6), as 19h, o livro JUSTIÇA INFAME: crime, escravidão e poder no
Brasil imperial. O evento será no Espaço AMEI (São Luís Shopping). A
publicação é fruto da sua tese de doutorado defendida há dois anos, mas houve
uma adaptação do trabalho para o livro, tanto com relação à linguagem, quanto
ao aspecto da discussão sobre o assunto.
“Fiz adequações para foca naquilo que é
o objeto principal da minha pesquisa que é a forma como o judiciário foi sendo
construída ao longo do século XIX, como ele enfrentou esse desafio bastante
difícil que foi lidar com a escravização de homens e mulheres daquele momento”,
conta Yuri Costa.
O
lançamento terá uma atração cultural e um debate com o tema “A Justiça no
Brasil: dimensão histórica e atualidade”, que analisará a Justiça brasileira no
século XIX e os desafios de sua estruturação, refletindo sobre os usos do
Judiciário pelas elites daquele contexto e as projeções desse quadro para os
dias atuais, com as participações do autor, da historiadora Regina Helena
Martins de Faria e o do defensor público estadual Jean Nunes, todos professores
universitários.
Segundo Yuri Costa, a obra analisa representações
das elites sobre escravos na segunda metade do século XIX e a influência de
fatores políticos sobre o Poder Judiciário imperial. O livro tem como pano de fundo o estudo do
crime ocorrido em 1876, em São Luís (MA), atribuído à senhora Ana Rosa Viana
Ribeiro, personagem rica e casada com um influente político. O suposto
assassinato de uma criança escravizada de oito anos, levou à prisão e à
acusação da senhora pelo Tribunal do Júri. O caso ficou conhecido como Crime da
Baronesa.
“Essa publicação é analisada do posto de
vista jurídico e literário. Da parte jurídica com as formas processuais, e
literária, por conta da participação de literatos nesse processo. Na minha
perspectiva, trago uma visão um pouco diferenciada porque vou muito para as questões
políticas que influenciaram esse crime. Eu vou para além do processo judicial
que registrou o crime e a sua apuração. Eu vou analisar quais foram os agentes
políticos que faziam parte desse cenário, quem é que estando dentro do
processo, ou mesmo fora, mas com algum tipo de influência, participou da
disputa política que acabou sendo sintetizada nesse processo. Então, há dois
partidos em disputas naquele momento, o liberal e o conservador, que ambos, com
interesses antagônicos, utilizaram aquele crime como forma de projetar essa
disputa política para dentro desse processo criminal”, aponta o defensor.
Em seu livro o Yuri Costa escreveu que aquele
foi um caso sem precedentes na história do Judiciário maranhense, pois desafiou
os limites do poder senhorial sobre sua propriedade escrava, além de adquirir
destacada repercussão na província e mesmo na Corte. Contribui, por isso mesmo,
para o entendimento da Justiça e da política no Império a partir de uma
localidade periférica. Distante do Centro-Sul do país, o Maranhão tensionou as
regras projetadas para o Império, imprimiu traços peculiares à armação
burocrática pensada para a nação e certamente inventou formas diversas de
corrupção das instituições do século XIX.
Baronesa
inocentada
Segundo artigo de Rui Cavallin Pinto, “em 14 de
novembro de 1876, foi levado ao cemitério da Santa Casa de Misericórdia, para
ser enterrado, o corpo do menino escravo, Inocêncio, de 8 anos de idade, que
apresentava ferimentos generalizados, como contusões, três na cabeça, com
derramamento cerebral; feridas e equimoses em todos os membros do corpo e até
sinais de ruptura do reto, provocada (ao que se disse), pela introdução de um
garfo no ânus. Lesões essas produzidas, provavelmente, por pancadas, açoites,
instrumentos contusos ou pressão por cordas, ou outro qualquer meio contundente
de maior impacto”.
De acordo com pesquisa do defensor Yuri
Costa, em 13 de novembro de 1876, residia no imóvel da rua São João, no Centro,
onde funcionou o Museu de Arte Sacra, Ana Rosa Viana Ribeiro, que oito anos
depois se tornaria a baronesa de Grajaú. Nessa data, supostamente teria a
senhora torturado e matado Inocêncio, um menino escravo de oito anos. Pelo
crime, foi denunciada e presa, numa acusação guiada pelo promotor público Celso
Magalhães. O delito, de grande repercussão, ficaria conhecido como “o crime da
baronesa”.
Dona Anna Rosa Viana Ribeiro, de 40
anos, era casada com o médico Carlos Fernando Ribeiro, chefe do Partido Liberal
da Província do Maranhão e pessoa de alto conceito na sociedade ludovicense,
que chegou a exercer a presidência da Província, como foi agraciado, mais
tarde, com o título de Barão do Grajaú, por D. Pedro II.
D. Anna gozava, entretanto, de fama de
ser mulher geniosa e ciumenta. Dela corria a versão de ter mandado arrancar a
torquês os dentes da escrava Militina, porque a beleza e o brilho deles
despertaram a admiração de seu marido. Fora envolvida também no maltrato a
escravos, que constavam de registro policial.
Diante dos prenúncios do povo e
precedentes foi aberto inquérito policial contra a baronesa pelo crime de
homicídio, previsto no art. 193, do Código Penal do Império, com a pena de
galés perpétuas, no grau máximo.
O promotor era Celso Magalhães moço da
Província, de 27 anos, formado no Recife, onde, durante a vida acadêmica,
lograra alcançar notoriedade como poeta e escritor de postura abolicionista e
republicana. A decisão seria, porém, como era próprio do tempo: a absolvição
unânime, que transitou em julgado, à falta de recurso.
“Ana Rosa foi, porém, absolvida. Como
ato de deboche ao promotor e ao grupo político que, rivalizando com sua
família, tentou condená-la, mandou a senhora substituir a antiga azulejaria do
sobrado pelo desenho de flores vermelhas, símbolo pelo qual Celso Magalhães era
conhecido”, escreveu Yuri Costa.
Serviço
O quê? Lançamento do livro JUSTIÇA INFAME: crime, escravidão e poder no Brasil imperial
Quando? Sexta-feira (6), às 19h
Onde? Espaço AMEI (São Luís Shopping)
Quanto? Aberto ao público
*Texto publicado em O Imparcial
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