quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Livro analisa Crime da Baronesa


O historiador e defensor público federal Yuri Costa lança na próxima sexta-feira (6), as 19h, o livro JUSTIÇA INFAME: crime, escravidão e poder no Brasil imperial. O evento será no Espaço AMEI (São Luís Shopping). A publicação é fruto da sua tese de doutorado defendida há dois anos, mas houve uma adaptação do trabalho para o livro, tanto com relação à linguagem, quanto ao aspecto da discussão sobre o assunto.
“Fiz adequações para foca naquilo que é o objeto principal da minha pesquisa que é a forma como o judiciário foi sendo construída ao longo do século XIX, como ele enfrentou esse desafio bastante difícil que foi lidar com a escravização de homens e mulheres daquele momento”, conta Yuri Costa.
 O lançamento terá uma atração cultural e um debate com o tema “A Justiça no Brasil: dimensão histórica e atualidade”, que analisará a Justiça brasileira no século XIX e os desafios de sua estruturação, refletindo sobre os usos do Judiciário pelas elites daquele contexto e as projeções desse quadro para os dias atuais, com as participações do autor, da historiadora Regina Helena Martins de Faria e o do defensor público estadual Jean Nunes, todos professores universitários.
Segundo Yuri Costa, a obra analisa representações das elites sobre escravos na segunda metade do século XIX e a influência de fatores políticos sobre o Poder Judiciário imperial.  O livro tem como pano de fundo o estudo do crime ocorrido em 1876, em São Luís (MA), atribuído à senhora Ana Rosa Viana Ribeiro, personagem rica e casada com um influente político. O suposto assassinato de uma criança escravizada de oito anos, levou à prisão e à acusação da senhora pelo Tribunal do Júri. O caso ficou conhecido como Crime da Baronesa.
“Essa publicação é analisada do posto de vista jurídico e literário. Da parte jurídica com as formas processuais, e literária, por conta da participação de literatos nesse processo. Na minha perspectiva, trago uma visão um pouco diferenciada porque vou muito para as questões políticas que influenciaram esse crime. Eu vou para além do processo judicial que registrou o crime e a sua apuração. Eu vou analisar quais foram os agentes políticos que faziam parte desse cenário, quem é que estando dentro do processo, ou mesmo fora, mas com algum tipo de influência, participou da disputa política que acabou sendo sintetizada nesse processo. Então, há dois partidos em disputas naquele momento, o liberal e o conservador, que ambos, com interesses antagônicos, utilizaram aquele crime como forma de projetar essa disputa política para dentro desse processo criminal”, aponta o defensor. 
Em seu livro o Yuri Costa escreveu que aquele foi um caso sem precedentes na história do Judiciário maranhense, pois desafiou os limites do poder senhorial sobre sua propriedade escrava, além de adquirir destacada repercussão na província e mesmo na Corte. Contribui, por isso mesmo, para o entendimento da Justiça e da política no Império a partir de uma localidade periférica. Distante do Centro-Sul do país, o Maranhão tensionou as regras projetadas para o Império, imprimiu traços peculiares à armação burocrática pensada para a nação e certamente inventou formas diversas de corrupção das instituições do século XIX.

Baronesa inocentada
Segundo artigo de Rui Cavallin Pinto, “em 14 de novembro de 1876, foi levado ao cemitério da Santa Casa de Misericórdia, para ser enterrado, o corpo do menino escravo, Inocêncio, de 8 anos de idade, que apresentava ferimentos generalizados, como contusões, três na cabeça, com derramamento cerebral; feridas e equimoses em todos os membros do corpo e até sinais de ruptura do reto, provocada (ao que se disse), pela introdução de um garfo no ânus. Lesões essas produzidas, provavelmente, por pancadas, açoites, instrumentos contusos ou pressão por cordas, ou outro qualquer meio contundente de maior impacto”.
De acordo com pesquisa do defensor Yuri Costa, em 13 de novembro de 1876, residia no imóvel da rua São João, no Centro, onde funcionou o Museu de Arte Sacra, Ana Rosa Viana Ribeiro, que oito anos depois se tornaria a baronesa de Grajaú. Nessa data, supostamente teria a senhora torturado e matado Inocêncio, um menino escravo de oito anos. Pelo crime, foi denunciada e presa, numa acusação guiada pelo promotor público Celso Magalhães. O delito, de grande repercussão, ficaria conhecido como “o crime da baronesa”.
Dona Anna Rosa Viana Ribeiro, de 40 anos, era casada com o médico Carlos Fernando Ribeiro, chefe do Partido Liberal da Província do Maranhão e pessoa de alto conceito na sociedade ludovicense, que chegou a exercer a presidência da Província, como foi agraciado, mais tarde, com o título de Barão do Grajaú, por D. Pedro II.
D. Anna gozava, entretanto, de fama de ser mulher geniosa e ciumenta. Dela corria a versão de ter mandado arrancar a torquês os dentes da escrava Militina, porque a beleza e o brilho deles despertaram a admiração de seu marido. Fora envolvida também no maltrato a escravos, que constavam de registro policial.
Diante dos prenúncios do povo e precedentes foi aberto inquérito policial contra a baronesa pelo crime de homicídio, previsto no art. 193, do Código Penal do Império, com a pena de galés perpétuas, no grau máximo.
O promotor era Celso Magalhães moço da Província, de 27 anos, formado no Recife, onde, durante a vida acadêmica, lograra alcançar notoriedade como poeta e escritor de postura abolicionista e republicana. A decisão seria, porém, como era próprio do tempo: a absolvição unânime, que transitou em julgado, à falta de recurso.
“Ana Rosa foi, porém, absolvida. Como ato de deboche ao promotor e ao grupo político que, rivalizando com sua família, tentou condená-la, mandou a senhora substituir a antiga azulejaria do sobrado pelo desenho de flores vermelhas, símbolo pelo qual Celso Magalhães era conhecido”, escreveu Yuri Costa.

Serviço
O quê? Lançamento do livro JUSTIÇA INFAME: crime, escravidão e poder no Brasil imperial
Quando? Sexta-feira (6), às 19h
Onde? Espaço AMEI (São Luís Shopping)
Quanto?  Aberto ao público


*Texto publicado em O Imparcial

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