...Palavra quando acesa
Não queima em vão
Deixa uma beleza posta em seu carvão
E se não lhe atinge como uma espada
Peço não me condene oh minha amada
Pois as palavras foram pra ti amada... (trecho de Palavra Acesa)
Ontem o poeta
José Chagas deixou este plano. Com um legado irretocável na literatura do
Brasil, o poeta faleceu aos 89 anos. Para lembrá-lo já que ele foi imortalizado
ao ser membro da Academia Maranhense de Letras, vou republicar uma matéria escrita por mim e que
foi veiculada no Jornal O Imparcial
em dezembro de 2013, quando ele foi homenageado com o CD A
palavra acesa de José Chagas, que contempla parte de sua obra cantada nas vozes de grandes
artistas da música brasileira. A obra primorosa e pensada em cada detalhe foi
produzida por Celso Borges e Zeca Baleiro. O lançamento foi no dia 5 de
dezembro, no Teatro da Cidade de São Luís (Centro).
Veja um trecho da reportagem
Nunca poesia e
música estiveram tão próximas. Pois essas duas artes cuja linha é tênue se
completam no CD A palavra acesa de José Chagas. Paraibano de nascença, mas
maranhense de coração, o poeta, que este ano completou 89 anos, vai ter parte de sua obra cantada nas vozes
de grandes artistas da música brasileira mesclando cantores locais e nacionais.
Na ocasião do
lançamento haverá uma audição com a presença dos artistas locais que
participaram e do poeta, e a exibição de um vídeo de 15 minutos produzido por
Zeca Baleiro a partir de uma entrevista que fez com José Chagas em 2006, e que
será mostrada especialmente no projeto. “Fiz
essa entrevista em 2006. Ele tem um pensamento muito lúcido sobre a vida e a
arte. E é um poeta profundo e sofisticado, por trás daquela sua aparente
simplicidade”, conta Zeca Baleiro. .
Toda a
concepção feita pelos produtores, cada qual em seu local de residência, demorou
pelo menos um ano e meio para ser concluída. Segundo Zeca a gravação exigiu
bastante trabalho. “Foi pauleira (risos). Muito trabalho. Por isso demoramos um
ano e meio pra realizá-lo. Celso foi cuidando da produção em São Luís e eu por
aqui. Mas conseguimos juntar um time da pesada, muito especial, que entrou no
projeto com o coração e a alma inteiros”, revela Baleiro, que interpreta Palavra Acesa, música que foi trilha
sonora da novela global Renascer (1993).
De acordo com
Celso Borges o projeto foi alimentado
pela admiração que tanto ele, quanto Zeca tem pelo poeta. “Além disso, tenho um
sentimento de amizade pela figura humana dele. O projeto foi concebido
justamente nesse espírito de admiração e amizade, já que a produção não contou
com patrocínio. Todos os artistas participaram de forma voluntária, abraçando o
projeto por acreditar no que ele tem de verdadeiro e pela justa homenagem. É
como a gente estivesse acendendo uma grande fogueira e dançasse em volta dela
ao som e com o espírito da poesia de José Chagas. O que fizemos foi dar melodia
à palavra acesa do poeta”, conta Celso.
O disco reúne 14
poesias interpretadas por vários artistas, entre outros tantos (21) que estão
envolvidos no projeto desde a autoria das composições, melodia e interpretação,
como: Ale Muniz, Assis Medeiros, Beto Ehongue, Tássia Campos, Suzana Travassos,
Toinho Alves, Celso Borges, Zeca Baleiro, César Teixeira, Chico César, Chico
Saldanha, Dicy Rocha, Ednardo, Josias Sobrinho, Fagner, Márcia Castro, Nosly,
Lula Queiroga, Silvério Pessoa, Fernando Filizola.
Trabalhar com
tanta gente de diferentes localidades pediu um trabalho dobrado. Enquanto Celso
ficava resolvendo as coisas em São Luís, Zeca tratava de outras em São Paulo. “A
logística foi complicada, mas tivemos adesões de vários artistas não
maranhenses que se encantaram com o projeto”, diz Zeca. “Claro que deu um
trabalhão, mas foi muito prazeroso porque a gente contou com a generosidade e
disposição de todos. Assis Medeiros, por exemplo, entregou a faixa praticamente
pronta. Gravou e mixou no estúdio que tem na casa dele, em Brasília. César
Teixeira, também, Beto Ehongue e Dicy, Zeca só teve que mixar e masterizar. A
que fiz com Alê foi feita no estúdio dele também”, explica Celso.
César Teixeira
que musicou Campoema do livro De lavra e de palavra, diz que fez a
música e arranjos para outra pessoa cantar, e não imaginava que ele mesmo faria
a interpretação. “Fiz uma toada sertaneja que representa bem o que diz o poema,
uma vez que fala da vida dura da lavoura, das lembranças de quando ele vivia
com a família na terra dele. Mas apesar de dolorosa a letra, a música não ficou
tão pra baixo”, conta.
Poeta-cantor - Natural da Paraíba, José
Chagas, Membro da Academia Maranhense de Letras, se diz um maranhense de coração.
Autor de mais de 20 livros, a maioria deles dedicada à cidade de São Luís, começou
a escrever aos 5 anos por influência de cantadores e violeiros da terra dele e
mora no Maranhão há mais de 50 anos. Entre as obras publicadas, estão Canhões do Silêncio, Colégio do Vento, Azulejos
do Tempo Maré/Memória, Os Telhados, Apanhados do Chão.
Perguntas//Celso
Borges/Zeca Baleiro
Em que
momento foi idealizado o A Palavra Acesa?
Celso
Borges - Há uns dois anos, eu conversando com Zeca surgiu a ideia de
fazer uma homenagem ao Chagas, que é um poeta que a gente gosta muito.
Discutimos um elenco de artistas e fomos fazendo aos poucos. Não é fácil porque
cada um tem a sua agenda pessoal.
Zeca Baleiro – Selecionamos alguns
poemas e elegemos alguns artistas. Foi lento, demorado, mas muito prazeroso o
processo de ver as canções nascendo, ganhando forma, arranjos e vozes várias.
O processo de gravação foi difícil?
CB - Nunca é fácil. Todo mundo tem a
sua vida, seu trabalho e é preciso um tempo pra fazer a música, gravar etc. Faz
parte de um processo. Zeca já tá acostumado com essa velocidade. Faz isso o
tempo inteiro, depende de terceiros, da disponibilidade dos músicos, de
estúdio. É um processo lento mesmo. Minha experiência na gravação do meu livro CD Música, que fiz em 2006, foi muito
importante, porque me ensinou a não ter pressa, saber esperar. Mas, claro,
sempre tem uma ansiedade incontrolável. Estamos muito felizes com o resultado.
Como foi a seleção dos poemas?
CB - Eu praticamente reli quase toda a
obra de Chagas e escolhi trinta poemas. Aí entreguei uma opção de três para
cada artista, que selecionou o seu. A única exceção foi César Teixeira que
preferiu trabalhar um poema que ele gostava muito e que não estava na lista.
ZB - Celso, Andréa e eu selecionamos os
poemas e mandávamos sugestões para os
compositores. Então eles ou compunham logo ou pediam uma segunda opção.
Direcionamos meio ao acaso, na intuição. Mas no final deu tudo muito certo, o
disco ficou lindo.
O que coube a cada um na produção?
CB - Eu escolhi os poemas e dividi essa
escolha com o Zeca, participei da composição de duas melodias e cuidei da
produção com os artistas locais. Minha mulher, a jornalista Andréa Oliveira, me
ajudou muito nessa parte. Zeca fez a produção geral, compôs duas faixas e
cuidou da participação dos artistas de fora de São Luís. Trocamos ideias o
tempo todo até chegar ao resultado final.
ZB - Dividimos o processo de produção.
Ele se encarregou de dirigir as gravações locais junto a compositores,
intérpretes, arranjadores e músicos, e eu fiz o mesmo com os “forasteiros”.
O poeta já viu o trabalho?
CB - Ainda não, preferimos guardar a
surpresa para uma audição conjunta quando o disco chegar. Fizemos uma visita a
ele, que nos deu toda a liberdade para escolher repertório e até dar título a
alguns poemas. Por exemplo: escolhemos vários do livro Os Canhões do Silêncio e demos nomes diferentes às músicas
compostas.
Zeca você estará no lançamento?
Estou tentando
remanejar uns compromissos pra ir. Adoraria estar presente, mas não sei se
conseguirei. Estou muito ocupado no momento.
Como foi realizar esse trabalho?
CB - Uma alegria enorme. Adoro música e
adoro poesia. E é uma honra dividir com o Zeca este tributo a um poeta que
admiramos. Também foi um grande prazer contar com a generosidade e o talento
dos artistas que participaram voluntariamente do projeto.
ZB - Pra mim foi um prazer enorme. O
Chagas sempre foi um grande amigo da minha família, frequentava a casa dos meus
tios Milton e Nair Ericeira, nos encontrávamos sempre, eu ainda adolescente.
Ele é um lorde. E um poeta imenso.